2014/08/09

Crônica



                                    Uma pequena descoberta

Na verdade não sabia se havia sonhado ou se tinha em mente uma discussão qualquer sobre alguma reportagem do dia anterior. Mas acordou com a palavra felicidade em mente, ou mesmo como alcançá-la ou tê-la no colo como um cãozinho novo ou um presente inesperado, embora buscado.
Feliz, felicidade, feliz cidade, feliz idade? O que era mesmo? Felicidade mesmo; algo como se buscar junto aos familiares, seguir um facho de luz surgido em algum lugar de um tempo que seja, uma surpresa que lhe traga uma espécie inusitada de prazer que, de solitário, torna-se compartilhado.
Fez o que sempre fez – trilhou os caminhos iguais, passou pelos mesmos lugares, conversou como pode com os conhecidos e amigos. Comprou o jornal, tomou o café, xingou o motorista abusado, falou do clima ameno e terminou a pé a trilha ao trabalho.
Um dia igual aos demais. Fez o que tinha que ser feito, da maneira como fazia, como achava que tinha que ser executado.  Mas não se lembrava exatamente porque a felicidade o perseguia. Ou melhor, porque pensava nela, ou devido a que.
Ao cair da noite, chegou ao apartamento, como nunca diferente, matou a fome com algo qualquer da geladeira, e acabou por se desmantelar na poltrona da sala, seu orgulho, esvaziado em prestações a perder de muitas vistas.
Acordado, de madrugada, remoia a ideia do que é ser feliz. Por incrível que pareça, embora hoje nos passe longe a menor sensação ou discussão que vá além do que nos remeta aos cinco metros ou cinco minutos, pensou, em anos, o que poderia ou deveria ter feito de sua vida para se sentir melhor. Talvez um contorno sobre uma ou outra discussão, um esquecimento possível sobre algo inesquecível ou impossível, um beijo interrompido ou um abraço mais apertado que houvesse sido.
Pensou então no que fazia. Nas respostas que obtinha, nos seus, naqueles que não queria perto, naqueles que queria como íntimos, nos movimentos, de manhã, tarde e noite. Pensou até mais não poder no poder de não mais não pensar, até porque no dia seguinte não era sábado ou feriado e, pasmado, não havia nada que o fazia saber por que pensar na felicidade. 
Foi dormir, de novo, enfim. E aí descobriu, muito sem querer, que um canal especial da TV a cabo, que era sempre visto no enorme aparelho instalado na sala de estar, de filmes, também era captado na televisão instalada no quarto, onde se exibia o trivial.
Ficou muito feliz.


Luciano Aquino Azevedo

Nenhum comentário: