O preso pode conceder entrevista a órgão de imprensa?
NÃO
“Aquele que entra no nosso falido
sistema carcerário sabe, de antemão, que diversos dos direitos que possuía do
lado de fora dos muros de um presídio são, de uma hora para outra, simplesmente
perdidos ou, então, severamente coarctados.
De efeito, é inegável que a
prisão traz consigo uma série de consequências, a começar pela perda do livre
exercício do direito de ir e vir. É bom dizer, nesse compasso, que o
encarceramento não só mitiga direitos como também cria obrigações, as quais
devem ser seguidas pelo detento.
Aliás, no que diz respeito às
obrigações e aos direitos dos presos (tanto os provisórios quanto os que
cumprem pena), a Lei de Execução Penal (LEP) é clara ao prevê-los,
expressamente, entre os artigos 38 a 43.
No tocante aos direitos, por mais
que o rol seja exemplificativo (artigo 41, LEP), é certo que o legislador, ao
elencá-los, buscou ser bem detalhista e minucioso. E, especificamente no que
diz respeito ao direito à comunicação do encarcerado “com o mundo exterior”, a
LEP é clara ao prevê-lo apenas “por meio de correspondência escrita, da leitura
e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes”
(art. 41, inc. XV).
Ou seja, exceção à
correspondência escrita, não há, ao menos na LEP, qualquer previsão legal que
permita ao preso, ao seu talante, conceder entrevistas à imprensa ou convocar
coletivas.
É bem verdade que, nesse
particular, a legislação não é expressa a respeito, ou seja, não proíbe nem
permite. Contudo, por razões de cautela e prudência, não se pode aceitar, sem
critério algum, que todo e qualquer preso, sempre que desejar, possa exercer um
“direito” que a lei não prevê claramente, qual seja, o de ser entrevistado.
É bom dizer que não se está aqui
buscando cercear a liberdade de expressão dos detentos. Longe disso! Mas, dada
a condição de “preso”, é forçoso reconhecer que até mesmo o direito de se
expressar sofre severas restrições, assim como diversos outros ínsitos à pessoa
humana.
Caso o detento queira se
expressar “ao mundo exterior” de forma diversa daquela prevista na LEP, que o
faça por intermédio do seu advogado ou, então, da defensoria pública ou de seus
familiares.
Até porque, sobretudo para a
manutenção da segurança interna dos presídios, seria temerário, para se dizer o
mínimo, que os veículos de imprensa em geral pudessem ter acesso livre e
desimpedido a todo e qualquer detento.
Daí, pois, é que, longe de ser um
“direito”, o acesso do preso à mídia deve ser reservado para situações realmente
excepcionais, de comprovado interesse público (o que é diferente do mero
“interesse do público”, de cunho eminentemente sensacionalista).
Aqui, vale acrescentar que a LEP,
ao prever os direitos dos presos, também foi taxativa ao determinar que o recluso
deve ser protegido “contra qualquer forma de sensacionalismo”.
Assim, quando o interesse público
demandar a realização de uma entrevista com um detento específico, nada impede
que um determinado veículo de imprensa ouça o referido preso, entrevistando-o a
respeito de um fato qualquer.
Nunca é demasiado lembrar,
contudo, que o encarcerado está sob a custódia do Estado, o que justifica,
pois, que uma entrevista só possa ser realizada mediante prévia autorização da
autoridade judicial responsável.
Nesse ponto, cumpre sempre
repisar que, em tais hipóteses, a decisão a ser proferida pelo magistrado
deverá ser pautada, sempre, tanto pela manutenção da segurança interna do
estabelecimento prisional, quanto pela efetiva e real necessidade daquela
entrevista para o interesse público. O sensacionalismo barato, o uso da
imprensa para autopromoção do crime etc., sempre devem ser evitados.
Como conclusão, entendo que o
preso, seja o provisório, seja o condenado, não está autorizado, a priori, a
conceder entrevistas, livremente, aos veículos de imprensa. Tal restrição
encontra guarida na manutenção da ordem e segurança internas do presídio, bem
como no direito que tem o detento de ter a sua imagem e a sua identidade
resguardadas e imunes à mera exploração jornalística. No entanto, em situações
especialíssimas, certas exceções podem ser admitidas, desde que precedidas de
expressa autorização do Poder Público.”
Euro Bento Maciel Filho – Advogado, professor de Direito Penal e
vice-presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB SP
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