2015/01/20

Novo ano: oportunidades do cooperativismo financeiro em cenário econômico adverso, por Ênio Meinen

“A vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa, sossega e depois
desinqueta. O que ela quer da gente
é coragem” (Guimarães Rosa)

Parece haver um grande consenso de que em 2015 teremos de nos reposicionar como Governo, cidadãos e empreendedores. E os ajustes – para assegurar a travessia – serão bastante sensíveis do ponto de vista financeiro, concentrados na máxima do “gastar menos e melhor”, já que a economia parece não dar sinais de grande vitalidade.
 
E como esse cenário repercutirá no mercado bancário e, em particular, no cooperativismo financeiro?

Por conta das expectativas nada animadoras sobre nível da atividade econômica e do já elevado grau de comprometimento da renda dos brasileiros com o pagamento de dívidas há pouco contraídas, é improvável que o sistema financeiro convencional sinta-se à vontade para seguir emprestando com o apetite de outros tempos, especialmente para financiar o consumo. Isso inclui até mesmo os bancos oficiais, uma vez que o Tesouro já não tem o mesmo fôlego para bancar as necessidades de capital dessas instituições.
 
E tem mais: porquanto também se prognostica a descontinuidade dos reajustes reais nos salários (a prioridade será manter o emprego), combinada com novas demissões, notadamente na indústria, aumenta a preocupação com a inadimplência. Crescendo as impontualidades nos resgates das obrigações junto ao sistema financeiro, acentuam-se as provisões, o que, por sua vez, diminui a disponibilidade de capital para novos empréstimos.

Para o cooperativismo financeiro, sem que se despreze a cautela requerida em tais circunstâncias, o fato de a concorrência retrair-se no crédito gera uma grande oportunidade. Como as cooperativas conhecem melhor o seu associado do que o banco a seu cliente, devem aproveitar essa proximidade e antecipar-se aos concorrentes na busca do bom tomador. É inegável que a agilidade – para atender a uma necessidade, muitas vezes emergente, do associado – fará aumentar o sentimento de gratidão e de pertencimento do cooperado, além de impulsionar a migração de seus negócios complementares (mantidos, não raro, em instituição convencional) para dentro da cooperativa. Essa atmosfera, ademais, aponta para a possibilidade de atração de novos cooperados, diante de sua insatisfação como clientes de bancos…
 
Consulta a períodos recentes de semelhante adversidade ou incerteza, tanto no ambiente doméstico como externo (vide, por exemplo, 2008/2009), revela que as cooperativas deram saltos mais representativos em sua expansão justamente nesses momentos, afirmando, assim, um de seus grandes diferenciais, que é o compromisso permanente com o cooperado e a sua comunidade. Essa fidelidade, como já se disse, reproduz-se no comprometimento (fidelidade recíproca) do cooperado com a sua própria instituição financeira.

A conjuntura também sugere uma oferta mais intensiva do portfólio de produtos e serviços fora da intermediação financeira. Com efeito, a prudência adicional que se impõe em relação ao crédito (pelo alto risco envolvido) há de impulsionar a exploração das inúmeras alternativas de negócios já disponíveis – e ainda muito pouco ativadas – no meio cooperativo, como seguros, cartões, consórcios, previdência privada, cobrança, convênios e adquirência (de cartões), soluções essas de elevado potencial de rentabilidade e irrelevante consumo de capital (pelo risco irrisório).  Neste particular, aliás, as cooperativas enfrentarão o apetite voraz dos bancos de varejo, que se tornarão ainda mais agressivos na busca de receitas novas para recompor a redução dos ganhos com o crédito.
 
Por fim, o cooperativismo deverá também “entrar no clima” que identifica – e desafia – os novos tempos da nação como um todo. Daí que, de um lado, rever seus modelos organizacionais de modo a, por exemplo, aproveitar adequadamente as estruturas de segundo e terceiro níveis sistêmicos (gastando menos e melhor), e avançar nos processos de aglutinações/incorporações (tanto para economizar como para ampliar os limites operacionais de forma a atender a demandas de crédito mais expressivas), e, de outro, repensar o padrão de seus investimentos, otimizando-os, serão movimentos cuja eficiência fortalecerá o setor e alavancará a sua presença no mercado financeiro.
 
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Ênio Meinen é advogado, pós-graduado em direito (FGV/RJ) e em gestão estratégica de pessoas (UFRGS) e autor/coautor de vários artigos e livros sobre cooperativismo financeiro – área na qual milita há 31 anos -, entre eles “Cooperativismo financeiro: percurso histórico, perspectivas e desafios”. Atualmente, é diretor de operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob).

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