2015/03/09

Nova regra deve integrar cooperativas financeiras

A rápida expansão das cooperativas de crédito tem levado o Banco Central (BC) a atender, pouco a pouco, o pleito desse segmento e abrir caminho para que elas operem em um modelo cada vez mais similar ao dos bancos.

A mais recente regulamentação para o setor foi levada para consulta pública em novembro e, além de incentivar ainda mais a expansão do setor, deve levar também a um movimento de consolidação, com fusões e até encerramento de operações. De acordo com uma fonte do setor, o BC vê com bons olhos uma integração dos principais sistemas cooperativos em operação hoje.

Com as novas regras, o BC vai mudar o modelo de segmentação das cooperativas e facilitar as regras para que qualquer pessoa possa tomar crédito e usar outros serviços financeiros de uma cooperativa, ponto que as coloca ainda mais próximas dos bancos. Em contrapartida, o BC pede às cooperativas um reforço na gestão de riscos e na governança corporativa.

Em suma, pela ótica das cooperativas, o novo modelo que começa a ser construído deve passar a incomodar os bancos. As normas indicam que o objetivo do BC é profissionalizar o setor e legitimar o seu crescimento, especialmente depois da criação do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop), no início do ano passado. Procurado, o BC não quis comentar.

“O governo quer que a gente pulverize o crédito, que a gente chegue onde os bancos não chegam”, afirma Leo Trombka, presidente da Unicred, sistema cooperativo com foco na área de saúde.
Nos últimos cinco anos, o setor de cooperativas de crédito quase triplicou de tamanho. Em setembro de 2014 (último dado disponível no BC), as cooperativas detinham ativos somados de R$ 148,8 bilhões ante R$ 51,9 bilhões em 2009. Enquanto isso, o sistema financeiro cresceu pouco mais de duas vezes.

Com esse cenário se desenhando, o BC passou a olhar com mais atenção o risco das cooperativas e a maneira como essas organizações são segmentadas. Até então, as cooperativas eram divididas pelos associados, como, por exemplo, uma cooperativa voltada para os profissionais da saúde ou para o agronegócio. A nova regulamentação, no entanto, deixa de classificar as cooperativas por seus cooperados e passa a dividi­las pelo risco das operações desenvolvidas.

Com a mudança para uma segmentação com foco nas operações, as cooperativas que desejarem poderão oferecer seus serviços a qualquer pessoa. Hoje, já há cooperativas de livre admissão, mas a mudança no modelo abre espaço para que outras instituições mudem seu estatuto social nesta direção, desde que provem que têm capacidade para sustentar o risco desse cenário.

“Isso foi uma demanda das cooperativas e o Banco Central atendeu. Vemos isso de forma positiva para o crescimento das cooperativas”, disse o consultor jurídico do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo, Paulo Vieira. Assim, ele espera que as cooperativas passem a competir mais fortemente com os bancos.

Na prática, nas cooperativas de livre admissão, o ingresso de cooperados funciona quase como abrir uma conta em um banco. “A grande diferença é que você tem que aplicar um valor mínimo de capital e passa a ser sócio da cooperativa”, explica o consultor jurídico do Banco Cooperativo Sicredi, Blair Costa D’Avila. O valor mínimo varia de acordo com as cooperativas.

Segundo o diretor operacional do Sicoob Confederação, Francisco Silvio Reposse, as cooperativas não têm obrigação de mudar o modelo, mas ele crê que esse será o caminho escolhido por muitas. “Acredito que a maioria vai fazer a mudança e permitir que toda a sociedade tenha acesso a elas”, explica.

D’Avila, do Sicredi, avalia que a nova regulamentação vai estimular o setor. “Vai estimular novas cooperativas, além de alguns ajustes com fusões e surgimento de novos produtos”, disse. “O mercado de cooperativas tem muito espaço para crescer. Só não cresce mais pela incapacidade do segmento de se capitalizar para isso”, diz D’Avila.

Neste novo contexto, as cooperativas precisarão atender requerimentos específicos, de acordo com as operações que desempenham. Na regra, as cooperativas de crédito plenas são as que farão operações mais complexas, muito similares aos bancos, como captação, empréstimos e repasses de instituições financeiras, além de crédito, garantias e aplicação de recursos no mercado de capitais.

Já as cooperativas clássicas têm uma gama menor de operações e não fazem, por exemplo, aplicações em títulos de securitização de crédito ou em cotas de fundos de investimentos. Por fim, quem carrega o modelo operacional mais simples é a chamada cooperativa de crédito de capital e empréstimo, que basicamente opera tomando capital e emprestando dentro da cadeia de cooperados.

Dentro dessas categorias, as cooperativas precisarão também atender um limite mínimo de capital e patrimônio de referência ­ compatíveis com o grau de risco de sua estrutura de ativos e passivos.
Neste contexto de crescimento e segmentação por risco, as cooperativas também precisarão, aos olhos do BC, de um modelo de auditoria interna mais completo. O trabalho será executada por uma Entidade de Auditoria Cooperativa (EAC), que também poderá fazer a auditoria externa ­o que reduzirá o custo para as cooperativas.

O objetivo com o novo modelo de auditoria é criar um padrão de avaliação de todo o sistema. “O Fundo Garantidor passou a ser demandante de uma avaliação padrão das cooperativas. Isso é muito bom porque todo mundo será avaliado com a mesma regra”, diz Reposse Junior, do Sicoob. Essa vinha sendo uma cobrança das cooperativas mais estruturadas ao BC e deve ser o caminho para que o setor se fortaleça e se consolide. (Colaborou Fernando Torres)

Fonte: Valor Econômico.

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