Uma pequena
descoberta
Na verdade não sabia se havia
sonhado ou se tinha em mente uma discussão qualquer sobre alguma reportagem do
dia anterior. Mas acordou com a palavra felicidade em mente, ou mesmo como
alcançá-la ou tê-la no colo como um cãozinho novo ou um presente inesperado,
embora buscado.
Feliz, felicidade, feliz cidade,
feliz idade? O que era mesmo? Felicidade mesmo; algo como se buscar junto aos
familiares, seguir um facho de luz surgido em algum lugar de um tempo que seja,
uma surpresa que lhe traga uma espécie inusitada de prazer que, de solitário,
torna-se compartilhado.
Fez o que sempre fez – trilhou os
caminhos iguais, passou pelos mesmos lugares, conversou como pode com os
conhecidos e amigos. Comprou o jornal, tomou o café, xingou o motorista
abusado, falou do clima ameno e terminou a pé a trilha ao trabalho.
Um dia igual aos demais. Fez o
que tinha que ser feito, da maneira como fazia, como achava que tinha que ser
executado. Mas não se lembrava
exatamente porque a felicidade o perseguia. Ou melhor, porque pensava nela, ou
devido a que.
Ao cair da noite, chegou ao
apartamento, como nunca diferente, matou a fome com algo qualquer da geladeira,
e acabou por se desmantelar na poltrona da sala, seu orgulho, esvaziado em
prestações a perder de muitas vistas.
Acordado, de madrugada, remoía a
ideia do que é ser feliz. Por incrível que pareça, embora hoje nos passe longe
a menor sensação ou discussão que vá além do que nos remeta aos cinco metros ou
cinco minutos, pensou, em anos, o que poderia ou deveria ter feito de sua vida
para se sentir melhor. Talvez um contorno sobre uma ou outra discussão, um
esquecimento possível sobre algo inesquecível ou impossível, um beijo
interrompido ou um abraço mais apertado que houvesse sido.
Pensou então no que fazia. Nas
respostas que obtinha, nos seus, naqueles que não queria perto, naqueles que
queria como íntimos, nos movimentos, de manhã, tarde e noite. Pensou até mais
não poder no poder de não mais pensar, até porque no dia seguinte não era
sábado ou feriado e, pasmado, não havia nada que o fazia saber por que pensar
na felicidade.
Foi dormir, de novo, enfim. E aí
descobriu, muito sem querer, que um canal especial da TV a cabo, que era sempre
visto no enorme aparelho instalado na sala de estar, de filmes, também era
captado na televisão instalada no quarto, onde se exibia o trivial.
Ficou muito feliz.
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